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70 anos da morte do Padre Cruz
“Caridade intensa que não parava nunca”
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Nos 70 anos da morte do Padre Cruz, o vice-postulador da causa de beatificação e canonização, padre Dário Pedroso, fala sobre o processo e recorda, ao Jornal VOZ DA VERDADE, a vida do “apóstolo da caridade” cuja sua ação “galvanizava os corações”.

 

“Pode-se dizer do Padre Cruz o mesmo que se diz de Jesus Cristo: passou fazendo o bem e curando a muitos”. É desta forma que o vice-postulador da causa de beatificação e canonização do Padre Cruz, o sacerdote jesuíta padre Dário Pedroso, começa por lembrar a vida do sacerdote que andava de batina, chapéu muito gasto, e com o terço e o saltério nas mãos, pelas ruas da cidade de Lisboa e por todo o país. A dispensa dos encargos paroquiais, deram ao “apóstolo da caridade” uma dedicação especial a outras obras de apostolado, sempre com a “grande estima” dos seus superiores.

De uma ponta a outra de Portugal, são várias as histórias que se conhecem do sacerdote que nasceu em Alcochete, em 1859. “O Padre Cruz dava tudo o que lhe davam e não havia aldeia ou cidade onde ele fosse pregar, e não visitasses os doentes, os pobres, os presos. Era um homem sempre com o coração nos outros”, salienta o padre Dário. E não faltam “histórias encantadoras”, assegura, ao Jornal VOZ DA VERDADE, este sacerdote. “Por exemplo, um episódio à porta da Igreja de São Domingos, na Baixa, em que uma senhora lhe dá um envelope com o dinheiro. Ele fica muito agradecido, mas chega um pobre e ele dá o envelope sem saber o que estava dentro. A senhora ficou aterrada porque lhe tinha dado 6 contos. E ele respondeu que, a ele, não lhe fazia falta esse dinheiro”, conta.

 

Oração

Para o atual vice-postulador da causa de beatificação e canonização do Padre Cruz, todas as ações conhecidas do sacerdote que faleceu em Lisboa, em 1948, são fruto da sua “profunda oração”. “Ele era um homem que rezava muito”, atesta, lembrando a forma como o Padre Cruz andava pelas ruas da cidade, pondo toda a gente a rezar o terço, sobretudo nos comboios e nas camionetas que apanhava. “Era um homem que estava embebido de Deus. Por isso é que a sua ação galvanizava os corações. Não era ele, era Deus nele, que o lançava nesta ação de caridade intensa que não parava nunca”, refere o padre Dário Pedroso, recordando a predileção do Padre Cruz pelos mais simples, chegando muitas vezes a pedir à sua irmã para “não se esquecer de dar o pão aos pobres” nos dias em que ele estava a viajar pelo país. E foram muitas as vezes em que isso aconteceu, como ficou demonstrado num postal de 1935: “Dizia: ‘Eu estou no Porto, vou para a Régua, depois sigo para a Guarda, depois, depois, depois’... e não parava. Mesmo as famílias que gostavam dele, e lhe davam hospedagem, queriam-no nas suas casas mais um dia para se consolarem com a sua presença. Por isso, hoje, muita gente, por Portugal inteiro, tem como relíquia a cama onde Padre Cruz dormiu, a cadeira onde o Padre Cruz se sentou...”, conta o padre Dário.

A um ano das comemorações dos 160 anos do nascimento do ‘santo’, o vice-postulador da causa do Padre Cruz deseja que essa e outras efemérides sejam sempre uma ocasião para dar a conhecer a vida do Padre Cruz a mais gente, em particular aos mais novos. “Fica a sugestão para despertar nos professores de Religião e Moral, nas escolas, o gosto por estas efemérides e entusiasmarem os alunos com a lembrança de quem foi o Padre Cruz”, refere o padre Dário Pedroso, partilhando que tem o desejo de criar uma banda desenhada e uma cantata para que a história do Padre Cruz possa ser “ouvida e cantada por mais gente, em mais lugares”.

 

Grande paixão

O desejo do Padre Cruz para ingressar na Companhia de Jesus, mesmo passados 54 anos depois da sua ordenação sacerdotal (1882), esteve, na opinião do padre Dário Pedroso, na “grande paixão” por São Francisco Xavier. Foi a partir da vida do cofundador da Companhia de Jesus que lhe veio a “atenção a toda a gente e o desejo de anunciar a Palavra”, acredita. “Já velhinho, ainda fazia a homilia todos os dias. Há tempos, um padre jesuíta contava-me que o Padre Cruz tinha ido, já muito idoso, a uma aldeia de Trás-os-Montes. Improvisaram um púlpito, na igreja, no meio do povo. Ninguém entendeu quase nada do que ele disse, mas toda a gente estava encantada porque era o ‘santo’ que estava a falar”.

A fama de santidade do Padre Cruz, que chegou até aos dias de hoje, é uma certeza para o padre Dário Pedroso: “Poderá ir mais cedo ou mais tarde para os altares, mas ele era um Santo! Um santo na caridade, um santo na oração, no cuidado dos doentes e dos pobres, um santo ao jeito de Madre Teresa de Calcutá ou de outros santos mais conhecidos”, garante, salientando o número incontável de pregações que levaram o Padre Cruz a muitas paróquias de Portugal e até ao Santuário de Fátima, onde esteve sempre “intimamente ligado”, chegando a ser o primeiro sacerdote a confessar a Irmã Lúcia, no momento da sua Primeira Comunhão.

Quanto aos poderes políticos da altura, o Padre Cruz sempre gozou de muita “estima” por todos, mesmo ateus e agnósticos. “Viam nele um homem de uma caridade, serviço e disponibilidade. Contam-se casos imensos de doentes que estavam às ‘portas da morte’ e que não queriam saber de Deus e padres para nada, mas o Padre Cruz ia visitá-los e eles lá se confessavam e recebiam os sacramentos! Era um homem com um carisma, um dom”, assegura o vice-postulador da causa de beatificação e canonização do Padre Cruz.

 

Milagres

O processo de canonização, em Lisboa, teve início em 1951, três anos após a morte do Padre Cruz. Atualmente, o processo está em Roma e aguarda por um documento que contenha, sobretudo, um “relato histórico de como povo entendia a santidade do Padre Cruz e o ambiente religioso e político em que ele viveu”, explica o padre Dário Pedroso, revelando que brevemente será nomeada, com a finalidade de completar o que falta desse documento, uma comissão da qual ficará responsável o sacerdote jesuíta padre António Júlio Trigueiros.

No processo de canonização, o padre Dário Pedroso lamenta o facto de não ter ainda chegado à causa da canonização algum milagre, comprovado cientificamente, que tenha resultado da intercessão do Padre Cruz. “É natural que exista, mas as pessoas não estão sensibilizadas para o facto de ser preciso comprovação com o relatório médico”, conta.

Já “milagres em vida” contam-se “muitos”, refere. Um desses milagres aconteceu durante a distribuição de pão pelos pobres. “A pessoa que estava com ele disse que o pão não chegava. Ele disse: ‘Não se preocupe. Deus, Nosso Senhor resolve’. Foi dando, dando, dando e o pão nunca acabou”, conta. Outro milagre contado pelo padre Dário Pedroso refere-se à “célebre história” do comboio. “Não tendo dinheiro, o Padre Cruz pediu para que lhe dessem oportunidade de fazer a viagem de comboio. Disseram-lhe que não e o comboio não andou enquanto não permitiram que ele entrasse para a carruagem. As pessoas tomaram isto como milagre, como ação de Deus que o protegia”, conta o vice-postulador, revelando ainda “a intuição” do Padre Cruz para saber se uma criança já estava batizada ou não.

 

Devoção

Os inúmeros relatos que marcaram a vida do “apóstolo da caridade” ultrapassaram a fronteira de Portugal, levando vários autores estrangeiros a publicarem livros sobre a vida do Padre Cruz. “Nunca pensei que houvesse tanta gente no mundo que nos escrevesse e falasse do Padre Cruz, bem como não sabia que havia vários livros editados, e no estrangeiro, por autores estrangeiros, sobre a sua vida”, conta o padre Dário.

Em Portugal, ao jazigo onde o Padre Cruz está sepultado, no cemitério de Benfica, acorrem diariamente vários devotos. “Quando celebramos o dia do seu nascimento (29 de julho) e morte (1 de outubro), chegam camionetas de Viana do Castelo, Monção, Gondomar e de muitos outros sítios. Há uma devoção maior daquela que eu imaginava quando tomei conta deste serviço”, em outubro de 2016, testemunha o padre Dário.

Atualmente, a Causa de Beatificação e Canonização do Servo de Deus Padre Francisco da Cruz SJ edita o Boletim quadrimestral ‘O Servo de Deus, Padre Cruz’ e a revista trimestral ‘Graças do Padre Cruz S. J.’, sendo que o próximo número, publicado em breve, vai conter uma fotografia das exéquias do Padre Cruz, em 1948, “excecionalmente” presididas na Sé de Lisboa a que acorreu uma “multidão imensa”. “Foi um acontecimento nacional! ‘Morreu o Santo!’ – Era o que se dizia em Lisboa”, recorda o padre Dário Pedroso.

 

Mais informações sobre a Causa de Canonização do Padre Cruz:

https://pontosj.pt/causapadrecruz

 

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Celebração dos 70 anos da morte do Padre Cruz

“Viver do essencial”

 

No dia em que se assinalaram os 70 anos da morte do Padre Cruz, o superior provincial dos Jesuítas destacou o modo “muito elementar, simples” presente na vida do Padre Cruz, que também foi visível na vida de muitos santos. “Percebemos que conseguiram viver do essencial, de uma profunda comunhão com o Senhor que os torna profundamente apostólicos, querendo levar esse amor, essa proximidade, àqueles que encontram, de modo particular os mais pobres, os mais simples”, apontou o padre José Frazão.

Na Missa, celebrada na capela do cemitério de Benfica, em Lisboa, no passado dia 1 de outubro, o sacerdote jesuíta salientou ainda três marcas da vida do “apóstolo da caridade”. Em primeiro lugar, “uma profunda união com Deus, alimentada por uma atitude constante de oração”. “Percebemos que a intimidade que o Padre Cruz cultiva com o Senhor nasce de quase uma rotina, uma prática constante de oração, que, sendo muito simples, gera um laço muito forte. É um homem profundamente ligado ao Senhor”, descreveu.

Outra marca da vida do Padre Cruz, segundo o superior provincial dos Jesuítas, é o seu “olhar puro”. “É um olhar purificado pelo Senhor. Por isso, o Padre Cruz é alguém que consegue ver Deus em todas as coisas e deseja profundamente que todas as coisas e todas as pessoas se revejam na luz. Por isso, tem uma vontade enorme de levar Deus às pessoas e de levar as pessoas a Deus”, apontou.

Por último, o “profundo amor evangélico pelos pobres” é, para o padre José Frazão, uma das marcas do apostolado do Padre Cruz, traduzido em constantes viagens “para ir ao encontro dos mais pobres, nos hospitais, nas cadeias, pessoas sozinhas...”. “Vemos este desejo de ir ao encontro. A união com o Senhor, que lhe dá um olhar puro, leva-o não a fechar-se, mas a ir ao encontro”, garantiu o padre jesuíta, na homilia da Missa que assinalou os 70 anos da morte do ‘santo’ Padre Cruz.

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